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RUMO AO SUL

RUMO AO SUL

Melancolia


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Oh dôce luz! oh lua!
Que luz suave a tua,
E como se insinua
Em alma que fluctua
De engano em desengano!
Oh creação sublime!
A tua luz reprime
As tentações do crime,
E á dôr que nos opprime
Abres-lhe um oceano!

É esse céo um lago,
E tu, reflexo vago
D'um sol, como o que eu trago
No seio, onde o afago,
No seio, onde o aperto?
Oh luz orphã do dia!
Que mystica harmonia
Ha n'essa luz tão fria,
E a sombra que me guia
N'este areal deserto!

Embora as nuvens trajem
De dia outra roupagem,
O sol, de que és imagem,
Não tem essa linguagem
Que encanta, que namora!
Fita-te a gente, estuda,
(Sem mêdo que se illuda)
Essa linguagem muda...
O teu olhar ajuda...
E a gente sente e chora!

Ah! sempre que descrevas
A orbita que levas,
Confia-me o que escrevas
De quanto vês nas trevas,
Que a luz do sol encobre!
As victimas, que escutas,
De traças mais astutas
Que as d'essas féras brutas...
E as lastimas, as luctas
Da orphã e do pobre!

João de Deus, in 'Ramo de Flores'

Fotografia - Lua cheia em Faro por Diamantino Inácio

— com Diamantino Inácio.

 

Filhos da Terra

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Começo o dia a fazer gestos supérfluos
mas de que me sustento:
Digo “Bom dia” às flores da casa e da varanda
mesmo às urtigas que aí agora proliferam.
Não, não as extermino.
Admiro-lhes a persistência e a rebeldia.
São marginais nos jardins, perseguidas pelos jardineiros.
mas está provado que as plantas ditas daninhas
têm uma função na Natureza!
Bem-vindas todas, minhas queridas plantas,
As que plantei e as que me invadiram o território!
Assim os homens tratassem os outros homens
que lhes pedem guarida!
São, como todos nós,
filhos da Terra!

Teresa Rita Lopes

Fotografia de Eurídice Cristo

Gosto de acreditar

 

 

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Gosto de acreditar que a vida não acontece por acaso. Que não vivemos apenas de forma aleatória. Que as coisas que nos acontecem — sem serem opção claramente nossa — não acontecem só porque sim.

Gosto de acreditar que não sofremos à toa. Que os percursos são difíceis para darmos mais valor às coisas. Para apreciarmos, com mais consciência, a vitória. Que as gargalhadas ensinam-nos a saborear o que é simples. Mas que o sofrimento também tem algo para nos ensinar. Que a vida só nos mete em labirintos dos quais sabe que conseguimos, um dia destes, sair. Que sentirmo-nos felizes é uma recompensa pela forma verdadeira como vivemos. Que só nos sentimos tristes quando não estamos no caminho certo. Quando é preciso mudar. Quando é preciso aprender. Gosto de acreditar que a dor só vem do tamanho que vem porque somos capazes de a suportar. Porque somos suficientemente fortes. Porque temos força para aguentar tudo, se for tudo o que vier. Que o instinto da sobrevivência amplifica a nossa coragem e resistência. Que nos torna impermeáveis a tudo. Até ao que achamos que não.

Gosto de acreditar que não nos cruzamos, uns com os outros, para entreter o tempo. Que a amizade é uma viagem. Que o amor nunca é em vão. Que é sempre necessário e inevitável — mesmo quando dói. Que os sentimentos são o que são porque não podiam ser outros. Porque nenhum outro nos mostraria mais um bocadinho da vida como ela realmente é.

Gosto de acreditar que as minhas escolhas têm uma finalidade que vai além da meramente circunstancial. Que só me acontece aquilo que me pode levar a ser uma pessoa melhor — mesmo que, nesse percurso, bata no fundo. Que a dor e a desilusão têm tamanhos proporcionais ao meu bom carácter. Que, quando chegar o momento certo, a dor passa. E que a alegria de viver é a única coisa que quero, realmente, reter de toda esta vida que levo e à qual, tão genuinamente, me entrego.

[Gosto. Mas nem sempre acredito.]

Laura Almeida Azevedo (Faro)
no blog «apetece(s)-me», em http://apeteces-me.com/b077/

 

 

Lenda da Ria Formosa

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No tempo antigo de Gharb mourisco, um cristão corria riscos e vivia perigos e a própria natureza emudecia, perdia cor e brilho sob a Lei moura. Nos seus grandes castelos ao longo do Litoral, sinal de guerra, esta gente agarena levava uma vida opulenta e, por vezes1 consagrada à Poesia. Em todos os castelos não podia faltar, também, um valido que o governava e uma rainha que o trono lhe disputava. De olhos safiras e rostos morenos, as filhas do deserto tocavam harpas e liras e escondiam encantos...
Mas a este cenário faltava os experientes cavaleiros portugueses, à guerra afeitos, que altas portas derrubaram, muros elevados venceram e por ali todos entraram e buscaram seus tesoiros, infantas e princesas. Por três dias e manhãs, os cavaleiros ali deram provas do seu amor, porque outra mulher não amava como a mulher moura sabe amar.
Quiseram depois partir para Santa Maria de Haro, quando Allah se fez ouvir para vingar a gente do deserto. Alto e forte levantou a sua voz, com respeito e determinação, praguejando contra a gente cristã. Água ou pó de novo seria a pena do filho de Jesus Cristo e da mulher sarracena que a Allah cerrou o ouvido. Morreram sóis e Luas até que elas se transformaram em dunas douradas e eles em água do mar.
E o tempo parou, assim, por dias, meses e anos sem fim. Só mais tarde, eras passadas, voltaram gentes cristãs ao lugar do sol apolíneo e àquela suave luz e doces raios que a todos fazia amar. E quem vislumbrasse o verde do mar num sonho parecia embarcar...Rica, bela e graciosa, logo à Ria decidiram chamar Formosa! Entretanto, cada princesa lá continua encantada, porque a lenda ainda hoje reza que é feliz e assim amada!

Fonte Biblio AA. VV., - Lendas e Gastronomia Olhanenses Olhão, Ensino Recorrente e Educação Extra-Escolar / Coord. Concelhia de Olhão, 2002 , p.4

Fotografias de Isaura Almeida

ALGARVE Casa Tradicional

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Casa Tradicional
Inspirações mouras

A arquitectura tradicional algarvia reflecte a história, o gosto popular e as necessidades das gentes do sul.
A brancura da cal nas paredes, eficaz reflectora da luz do sol, e frequentemente renovada como prova de asseio e vaidade, e as barras coloridas a emoldurar portas e janelas, são elementos que unem as casas algarvias. As características variam, no entanto, consoante as regiões.
Na Serra do Caldeirão, as casas eram circulares e feitas de pedra ou barro, com tecto cónico de colmo; hoje são quadrangulares e feitas em xisto e grés vermelho. Em Monchique, são construídas em pedra granítica acinzentada. Já na planura, a casa típica é pequena, e levantada com pedra e cal, e telha moura ou portuguesa. No litoral, são construídos terraços sobrepostos, com escadas exteriores, terminando com um mirante no ponto mais alto, para observar o regresso do barco da faina. Também características do litoral, de influência muçulmana, surgem as açoteias, terraços onde se procura o fresco e o descanso, e onde se secam figos, amêndoas e milho. De utilidade decorativa, as platibandas rematam as fachadas, com formas geométricas e múltiplas cores. As chaminés, símbolo da região algarvia, exibem-se trabalhadas em todas as habitações.

Há todo um mar...

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Há todo um mar
inteiro, imenso e manso
na volúpia e no balanço
desse teu jeito de caminhar.

Anca subida, maré cheia
anca em baixo, praia-mar
um subtil maneio,
um enleio que me enleia
e tece a teia do meu gostar.

Mar do Sargaço e do abraço,
laço que enlaça e traça
em mim, o itinerário do desejo
do beijo que há no teu andar.

 

Miguel Afonso Andersen, em "O início das águas" (Murmúrios da carne)

 

Fotografia da Praia de Faro por Martyna Mazurek fotografia

Frente ao mar

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Frente ao mar

meu corpo ardente e nu de marinheiro
pelo sangue. Fervem-me nas veias
um milhão de ondas em repouso.
Em meus olhos cativos e saudosos
— imagem da minha solidão imensa —
o abraço que me une a ti
ó mar
deus pagão de olhar luminoso e belo!
Recebe ó mar este afluente silencioso
que para ti corre e contigo se confunde
o líquido canto a quem me ligo
pelo drama de não ser só teu.

 

Casimiro de Brito (Loulé)


Fotografia de Vitor Pina Silva (Portimão)

A Cegonha (Canção alentejana )

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O meu bem a sério
Inda não nasceu
Deus queira que nasça
Deus queira que nasça
P'ró amar sou eu.

Lá vem a cegonha
No bico um raminho
De meia encarnada
Vem dando à chegada
Ao seu velho ninho.

Ao seu velho ninho
Ponha os ovos ponha
Que seja bem-vinda
Branquinha tão linda
Lá vem a cegonha.

Senhora cegonha
Como tem passado?
Não há quem a veja
A ir à Igreja
Pousar no telhado.

Quando chega o Outono
Há uma que canta
Anuncia a hora
Que se vai embora
Leva meia branca.

Folclore musical do Baixo-Alentejo

Cartaz elaborado por @RUMO AO SUL

Platibanda

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Azul-cobalto, almagre, amarelo ocre, aqui e ali um verde escurecido dão vida às casas algarvias através das suas platibandas. Platibandas que são parapeitos baixos a conter as açoteias ou, segundo alguns estudiosos, simples formas de ocultar os telhados ou de definir fachadas, permitindo em simultâneo o escoamento das águas pluviais. Independentemente da sua função, assumiram um valor ornamental a partir de finais do século XIX nas habitações térreas algarvias, casas caiadas de branco cujo cimo exibia essa policromia que ajudava a definir a sua silhueta e transmitia um sinal exterior de prosperidade. Por plágio, imitação ou importação? Não se sabe ao certo como surgiram. Contudo, apresentam ainda hoje para nosso deleite os rendilhados, floreados, relevos, motivos geométricos e, não raras vezes, art déco, sendo algumas delas amparadas por cornijas e balaústres. Resultando da criatividade do construtor algarvio, elas são o rosto das nossas casa.

 

No livro "A Alma Algarvia"

Fotografias de Filipe da Palma

Saudades tuas ...

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Acordei com saudades tuas.

Há algum tempo que as saudades não me acordavam assim. Fiquei às voltas a relembrar-te. Quanto mais te relembrava, mais vontade sentia de te contar os meus dias, de saber dos teus. E mais saudades sentia de ti.

Sei que o tempo que nos separa é relativo. Para ti, pode parecer que foi ontem que cada um seguiu o seu caminho. Para mim, este tempo, que não é tanto quanto isso, sabe-me a eternidade. Há demasiado tempo que não oiço a tua voz. Há demasiado tempo que o teu riso não me contagia. Há demasiado tempo que não caminhamos lado a lado em dias de sol. E há demasiado que não sinto a felicidade de te ter nos meus dias. Há demasiado.

Acordei com saudades tuas. Queria que o tempo que nos separa não existisse. Pelo menos, não hoje. Só para poder matar as saudades que sinto de ti. Só para poder abraçar o que nos separa. E relembrar tudo o que nos une. E que é tanto.

Quando o dia de hoje terminar, as saudades que tenho de ti deverão passar. O sono surgirá, envolvendo-me em histórias para lá de nós e o dia de amanhã há de vir, capaz de me distrair de tudo, como quase sempre.

Mas, enquanto o dia de hoje ainda for hoje, enquanto as saudades que sinto de ti estiverem aqui, quero que saibas: Gosto muito de ti. Fazes-me falta.

 

Laura Almeida Azevedo
apeteces-me

O corridinho

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O corridinho, que também se baila em algumas terras do Ribatejo e do Alentejo, é sem dúvida a dança mais tradicional do Algarve.
Os pares juntos numa roda dançam ao ritmo da música e do mandado. As saias das moças esvoaçam e não há quem resista a querer seguir a dança. A 'alma algarvia' é o seu tema mais conhecido.
O Corridinho surge nos primeiros anos do século XX. Este género musical teve origem na Europa oriental e foi trazido para o Algarve por um espanhol Lorenzo Alvarez Garvia para cortejar a louletana Maria da Conceição, dedicando-lhe a polca La Azucena.

A rápida popularização do acordeão, veio enriquecer os reportórios tradicionais das danças de salão da época (polcas e mazurcas ) e a concertina e os ferrinhos dão uma ajuda à voz do mandador, que organiza a roda apresentando os pares vestidos a rigor com roupas do campo e da cidade do início do século XX. E não se coíbe de lançar umas piadas ao jeito popular.

Fonte: http://www.inalgarve.net/#!blank/qlclu