Saltar para: Post [1], Pesquisa e Arquivos [2]

RUMO AO SUL

RUMO AO SUL

A Moura da Nora

Nora em Faro.jpg

 
Numa noite de Primavera, poucos dias depois da tomada de Faro, um cristão passava perto do Rio Seco, onde antes entravam as marés quase até Estoi, quando ouviu umas vozes tristes proferidas mansamente. Era meia noite e receou-se o cristão de alguma cilada. Parou e pôs-se a escutar, esforçando-se em distinguir uns vultos, de onde supos virem as vozes.
Em poucos momentos percebeu que eram um mouro e uma moura. Aquele aparentava os seus 48 a 50 anos e a moura era uma jovem em atitude de quem suplicava. O homem, numa expressão de angústia dizia:
- Não pode ser filha minha, aqui ficarás encantada
- E por quanto tempo querido pai?
- Até que esta nora dentro da qual mandei construir o teu palácio seja esgotada a baldes sucessivamente e sem intervalos.
E ao mesmo tempo que proferiu estas palavras, fez uns sinais cabalísticos e levantou os olhos para a lua que descrevia o seu giro na amplidão dos céus. A jovem depois destes sinais não proferiu palavra alguma e deixou-se lançar ao fundo da nora, sem proferir um ai. O mouro desapareceu em um momento sem que o cristão pudesse notar a direção que ele tomara.
No dia seguinte voltou o cristão aquele lugar e viu então a nora, cujo engenho mourisco era muito velho e usado. Tratou logo de saber a quem pertencia a nora e o terreno e comprou-os por bom preço. Mandou construir ao lado uma cabana de junco e para ali transportou alguns moveis. Passados dias começou o homem convenientemente auxiliado por um grande balde a trabalhar no esgoto da nora. Naquela faina trabalhou horas e horas sem interrupção dia e noite.
Quando no fundo da nora era já tão pouca água que nem enchia o balde desceu agarrado a uma corda. Apenas assentou os pés no fundo apareceu-lhe uma grande serpente que saíra de um buraco que comunicava para a nora. A presença do bicho foi o bastante para ele se encher de horrível pânico e sem tratar de saber se o animal vinha com más intenções subiu a mesma corda e saltou cá para fora. Nunca mais ali voltou, soube porém, dias depois, que a nora estava completamente entupida porque as suas paredes tinham caído e que a cabana por ele construída fora queimada em certa noite. Daí em diante começou a gente a falar do aparecimento de uma moura encantada naquele lugar, aparecimento que ainda hoje se repete, pois que atualmente foi reconstruida a nora.

Ataíde Oliveira em As Mouras Encantadas e os Encantamentos do Algarve

 

Fotografia - Nora (Faro) por Isaura Almeida