Chegaste
Chegaste
carregando o vento
de todos os oceanos
e eu
fio de horizonte
cais sem barcas
ou onda sem maré
desatei os passos
do meu mundo de cegueira
e dentro de mim
acanhei a dor das incertezas
quis
quebrar as margens
como brisa louca
tingir de sangue o mar
transpor a espuma
que envolve o meu corpo branco
mas a noite
trouxe de volta os sonhos
e eu não tinha as tuas mãos
soletrei
(depois)
o teu nome de cal ao amanhecer
incendiei o bosque
da tua imagem invertida
roubei a luz dos espelhos túmidos
e entreguei ao tempo nu os gestos
com que (des)vestiste os meus olhos
de pétalas caídas
pela exactidão das águas
sei agora
que as aves já não voam
no teu olhar esmaltado
nem a tua boca
(que me mordia)
nascerá nos meus seios plenos!...
Mariana Valente (mariAna)
(Serpa)
Fotografia - Cais Palafítico da Carrasqueira (Alentejo) por João P. Santos