Ingénuo pensei...
Ingénuo pensei,
que o adeus era um beijo, um até logo,
um barco partindo já com velas de regresso.
Não esta ansiedade, este silêncio,
este roçar arrítmico pelas dobras da espera.
Crédulo julguei,
que a distancia era um rio navegável
pela correnteza do cio,
entre o desejo de partir e ânsia de chegar.
Não este nevoeiro espesso e opaco
que a luz verde do teu olhar não rasga
e me cristaliza na memória
o sabor tutti-frutti do teu sorriso.
Inocente acreditei,
que a saudade era apenas e só
uma palavra dedilhada
na escala polifónica da tristeza.
Não esta guitarra em ferida,
este cilício que vibra e dói por dentro
no dó sustenido da tua ausência.
Entre puros enganos corre assim um tempo
padrasto da minha hora e desta idade
em ilusões e delírios derramada,
mas no canto mais perene desta liturgia
declaro-te para sempre, rainha coroada
no trono da minha mais ínfima alegria.
Miguel Afonso Andersen
(Ferragudo\ Algarve)
Fotografia - Praia do Castelejo num por do sol com neblina, por Euridice Cristo